quarta-feira, 11 de outubro de 2017

[Interregno]




Mergulhada para dentro, bem fundo, em pé, 
atrás do balcão, como se não existisse, bate, 
ligeiramente, as asas; compõe a auréola, 
languida, teatral e delicadamente, como se ela, 
a auréola, se pudesse partir num gesto mais 
impensado ou brusco. E eu, que entro invisível 
e fora de tempo, sento-me e mergulho os papeis 
nas palavras onde me amalgamo sem acordos 
ou regulamentos. Ninguém saberá onde começam, 
ou terminam, os papeis, as palavras, eu, a mesa, 
a cadeira e o próprio espaço que ocupamos. 
Entre paredes: um universo. A felicidade procria, 
a um canto. Nas paredes umas grandes nódoas 
da humanidade. E, num dia calmo como o de hoje, 
tudo permanece assim, num tempo desmedido. 
Até que ela, vinda de muito, muito, fundo, 
prepara um café, que eu nem pedi, nem consigo 
recusar, e, em voo, o deixa no espaço que será 
o da mesa, que não é minha. Sem perder tempo, 
antes que me esqueça ou o café arrefeça, paro, 
separo-me das coisas, organizo-me e bebo-o, 
sem açúcar, sem mexer, em contramão. 


 [sobrevoo]



4 comentários:

  1. [Parabéns! ;)]
    Sobre o poema, tenho a dizer que gosto, mesmo! :)
    Bjks
    :)

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  2. Nada como um café na hora certa, para nos fazer mergulhar de novo, com mais entusiasmo nos nossos universos... ;-)
    Esperando que voltes em breve do teu interregno, e que nos brindes com mais poemas assim... excepcionais... e sem açucares...
    Beijinhos! Resto de bom domingo e uma feliz semana!
    Ana

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