O meu silêncio não cabe na Terra,
Sobra-me a ausência que me encerra.
O fogo não consumiu as razões,
O bom senso ou a temperança.
Ó doce, ó travo de lembrança,
De velhas e passadas ilusões,
Tónico e sanha da mudança.
Calo-me, fala-te o Mundo
E não podes perder um segundo,
Com os meus sonhos de felicidade.
A tua conciliação não ilude,
Quando a ternura é um toque rude.
Guardo, indefinidamente, a saudade
Da antiga, solícita e perdida, atitude.
Sobra o ar que não me sacia o peito.
Resta o original sorriso contrafeito,
E a crua verdade encapotada.
Pára-me a vontade que me move,
No consentimento que reprove.
Vejo, sem ver, a redentora cilada,
Em ternura, que cativa e demove.
Numa onda de contínuo contentamento,
Em doce aproximação e amargo afastamento,
Felicidades, amada, na alegria do afago.
Não são milagres, nem fantasias,
Nem eu serei igual todos os dias,
São alvoroço e serenidade, o que te trago
E vão de encontro ao encontro que anuncias.
Mesmo que o "para sempre" não perdure,
Que a dúvida de um futuro não amargure
Este instante de partilha, presente de paixão.
É a afortunada desocupação que tem emprego,
Este é o desprendimento onde há apego,
Um momento em movimento de alienação.
Esta é a paz onde não há sossego.
Quero dar-te, amor, o meu colo,
Usa-o em consciência, sem protocolo.
Faz dele desassossego e local de quietude.
Reconforta e debilita o desejo
E na tristeza, concebe, nele, o festejo.
Visita-o sem pudor, em recato e amiúde,
Satisfaz a cruel míngua de sobejo.