quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Posso

Gravemente nativo,
Posso mostrar as erupções basilares
De uma alegria basáltica
Que brota da natureza,
Bruta,
Mas de alma esclarecida;
Expor o contentamento
E elucidar o nem sempre,
O nem nunca,
O nem nada,
O nem mais
E a descrença no redutor.

Não sou a soma de tudo o que sobre mim pintas.
Posso descrever, feliz,
A encosta agreste e ermada da vida genérica
Onde pousei as crateras da minha,
Preenchidas pelos alforges lisos da loucura;
Onde, também, desabrido corre o vento
Animador de insanidades
E despojador de alardes;
Onde, vestido de poeta,
Ainda absorto,
Sem aptidão ou existência para coisa alguma,
Plantei árvores autóctones
Que ninguém aparenta entender;
Onde «acessível» se compreende,
E é um destino, sempre, simples,
Criticamente despido,
Porque não pára e não podemos parar
Num corpo e mente em unidade críptica.

Posso, mas não imponho.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Canto


Na soleira da frágua,
Num ritmo eventual,
Muito além da memória instrumental,
Embrenho-me no oblíquo fio de água,
Que apesar de indiferente,
Corre flexível e complacente.

De imediato veio o rocio
Munido de confortos,
Embora frio,
No Cais dos Botirões.
De igual para igual,
A ria, que pretende beijar a esteva,
Confunde-se e une-se com uma diagonal
No limiar de várias ilusões,
Lesta, com inteireza,
Onde eu, só, sou mais alguém e um,
Na língua escassa da estreiteza.

Recebo a boa noite traçada
E acerto a fase da Lua;
Descalço a rua
E dispo a minha morada,
À luz e no timbre mental,
Com um sorriso acidental.


segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Distraidamente apagado


Eu estava aqui
Numas simples notas soltas
Num pedaço de papel
Por baixo de uma definição de pardo
Pousado num espaço branco
Em cima de um mocho
Sem me reconhecer
Sem particularidades
Sem as singularidades
Sem maravilhas do fazer-se noite
Sem encanto
Mas longe do teu decalque


quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Sinal

Necessito encontrar conteúdo e consistência
Não há tempo ou termos para protesto
Sequência para horizontes de sossego
E excede um rio de persistência
A paridade é um lugar manifesto
Para este claro apego
Apenas entorpecido
Nunca esquecido

Sustém um sinal de solvência
Procuro a rede
Rompe o zelo num espaço paralelo
Que ajusta a referência
Vontades esclarecidas na parede
E a alusão ao breve e belo
Povoado de certezas ávidas
E ainda com palavras grávidas

Esqueci-me e continuei no trampolim
Há muito que saíste
E ouvi dizer que a humanidade já não existe
Ignorou o sinal e também não partiu no seu fim


segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

O vento levou a minhas rimas


O desejo diz-me só
Em sombras de luar
Pó de estrelas
E vontade pintada
Consentimento distraído
De aura urgente
De lugar sem passagem
Na orla de um rio a transbordar

O vento levou as minhas rimas
Mostro as minhas mãos à lua
Depois do temporal
E diz-me que lhes sobra a chuva
E que me agarre ao norte
Das minhas mãos sem fase
No tempo que me anuncia
Uma oportunidade de paz

Aproximo o rosto do fim de dia
Ao rosto da noite dentro
No encanto do fulgor pungente
Do meu corpo inquieto
E numa força inteira e substantiva
Da energia dos afectos
Arde o desapontamento apontado
Produz delicados padrões de luz

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Palavras em formação


Trago algumas palavras,
Grávidas,
Em substituição das flores
E para não as chorarmos,
Na visita ao cemitério dos silêncios.

Hoje não suportaria ouvir os gritos de dor das plantas,
Ainda que se alegrassem,
No fim,
Em conclusão,
E as palavras dão alegria a este cardal.

Abraço todos e todos me abraçam,
As alegrias e os silêncios,
As alegrias das alegrias,
Os silêncios das alegrias,
As alegrias dos silêncios,
Os silêncios dos silêncios.
Entrego palavras,
Grávidas,
Por flores,
E sorrimos.


quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Epifania em construção


A harmonia
Na consciência de um ritual
No sorriso da serenidade

Amar
Num último suspiro
Num último sussurro
Sem forma

O riso
Numa imagem íntima
Em traços desamparados
De conceito e peito aberto
Desprendido do corpo

A harmonia
No silêncio de um concerto
No amor da areia

Amar
Num último trilho
Numa linha inteira
Sem fronteira

A lágrima
Numa imagem de fundo
Válida
Em polígonos desprotegidos
Numa saudade
E nela
Cumprimentos
O adeus apertado
Num círculo
Onde o anjo pára tenuemente
E os lábios esboçam a magia

Na energia difusa e rítmica
Do afecto de luz
A harmonia

Num outro nível
Num outro espaço
Sem limite
Amar


quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Base


A confiança mistura-se no manto
De folhas caducas
Caída
E em queixume e pranto
Permanece sem saída

Nem a reboada de alegrias
Em revoada
De várias travessias
Ousa levantá-la
Da forma quebrada
E vão encontrá-la
Longe e dividida
Confiança perdida


Também


Fica, por um momento.
Os sinos tocam a rebate,
Entoam a história
Que se perde num relento
Que te debate
Nos confins da memória,
Em métricas de outras estações,
Pintadas com cores de aluviões.

São as ave-marias
E a porta que não se abriu,
No lugar onde o beijo repousa.
São as minhas mãos frias
E a chama que não se uniu
Onde a vontade pousa
Na filosofia que ficou no forno
E o abraço é um retorno.


terça-feira, 15 de janeiro de 2013

E agora


Estou.
Nada envolve onde nada tem valor,
Um momento oportuno é tudo na vida.
As promessas jorram alergia;
As palavras implodem antes de criar frases,
Muito antes de produzir sentido,
Em tempos que são mais do que prosa
E, seriamente, menos do que poesia.
Um verso podou a alma,
Sem retrocesso,
Para reescrever o que não pode ser reescrito,
Numa estrofe de barro, ervas daninhas, durante
E um novo fim.
Hoje não existiu princípio,
Embora possa ter ocupado o pensamento.
Abraça-me, sem ardil, ria!
Sorrio sem dolo.
Divirtam-se!


sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Tenção


A basta linha conclui
Ama de um sentimento
Na última vereda
Em lágrima de alegria
De espelho íntimo
Fibras de certeza percebida
Sem rodear a sensação inexprimível
Da despedida do casulo
Demasiadamente apertado
Apartado do círculo perfeito
Que o anjo proclama em pregão
Abeira-se agradavelmente
Num derradeiro qualquer lugar
Num momento de sonho em sono
Propósito de fé
Silêncio de alma
O amor declamado
Pela areia curada
Que se deixa escrever na orla do rodopio
Da proximidade da eleição e gosto
Da atmosfera pendente
Profusamente reduzida e reluzente
Harmoniosamente musical
Corpo de pareceres
Sem proposta
Comoção e frémito digital
No filete do afecto
De uma manhã
Que se faz tarde
Noite dentro
Fio completo de prazer
Em plausíveis corpos impalpáveis
Expostos numa legenda alusiva



quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Vejo tempos


O ímpeto leva-nos

Perco-me na possibilidade que não se constrói
Nos labirintos dos espectros de estranhos
Nos caminhos de frustração que te compõe
Na máscara angelical que não se condói
Nas penumbras de um critério de vários tamanhos
Na fisionomia de uma bizarria que indispõe
Onde também tenho os meus fantasmas de arreganhos

E vejo amor

Percorro-me na possibilidade que se constrói
Nos labirintos dos espectros sorridentes
Nos caminhos que te compõe
Na face angélica que se condói
Em raciocínios clarividentes
Na fisionomia de uma alegria
Na vitalização de um sonho revelado
Onde também tenho o meu declarado