quarta-feira, 3 de janeiro de 2024

Soldado desconhecido

 
 
 
Na rua: 
 
Quase sobe o degrau imaginário, de terça-feira, 
O soldado desconhecido, banhado a bronze, 
De arma em riste. Talvez precise da cadeira. 
A cadeira diz asneiras e não é suficiente, 
Sabe que nunca esteve de pé, 
Por vezes faltou-lhe a fé, 
À cadeira, ao soldado, ao escriva e ao lente. 
 
Ou, num desnível sonhado, ao terceiro dia da semana, 
Que por acaso iniciou num domingo, antes da missa, 
Que não assisto, um vulto coberto a bronze aguarda 
com a arma pronta para algo imaginário e perpétuo. 
Imita um soldado e eu imito um observador curioso. 
Dar-lhe-ia a cadeira profusamente desbocada e escassa, 
Para seu, creio que, merecido descanso. 
 
Entretanto, eu não sei se devo pisar a relva, à terça, 
O soldado não tem mochila e gostaria de dar-lhe uma. 
Não a minha, que não é de bronze e contém o escuro 
Com que procuro a luz, a luz e umas explicações. 
 

Em casa: 
 
Os versos duvidam do tapete da entrada 
E a porta aberta permanece muda e fechada. 
Apanhei o silêncio desprevenido, 
Com o gato mais velho ao colo 
E com o gato mais novo aos pés. 
Os sonhos acorrem em gemido, 
Procuram luz na escuridão que descolo. 
Surpreende-se a sala, que apruma os rodapés; 
Os gatos, com a surpresa da sala; 
E o silêncio, que não se cala. 
 
Talvez eu seja um acaso, mas não o caso pessoal. 
Talvez eu tenha um registo inconfundível: 
Um sol poente à procura de ser perfeito e matinal; 
Demasiadas cores no meu caminho possível, 
Onde descobri o que vale, e ao que sabe, a promessa. 
Seria mais fácil se pudéssemos resumir toda esta peça, 
Levá-la ao expoente do seu valor indivisível, 
E isso com o tempo de quem não tem pressa; 
E tudo isto num maravilhoso e simples som audível, 
A dizer “amo-te”, ou “te amo”, de peito iluminado, 
Com os olhos em carícias e de sorriso arrebatado, 
Como uma eterna primeira vez, sempre nova e repetível. 
 
 
 
 [miscelânea] 
 [12 de setembro de 2023]