sexta-feira, 18 de março de 2022

Tem um dia feliz

 


Desejo-te um dia feliz, e fico inerte. 
A retribuição, não obrigatória, que não chega. 
Os passos, que se prolongam pelo silêncio 
Da caminhada, ressoam a despedida. 
Gela-me um pensamento glacial, 
Nesta época seca e de degelo. 
Aperta-se o meu peito, já apertado. 
Será que podes não acreditar em mim? 
Como pode, alguém, ter um dia feliz, 
Nas incertezas de um tempo triste e dúbio? 
Mas, quem nos iria supor nesta condição? 
Quem diria que a guerra ainda existe? 
Que batalhões de vírus nos espreitam? 
Ainda assim, desejei-te um dia feliz, 
O que mais me poderia desejar? 


 [miscelânea]
 [18 de março de 2022]
 
 
 

quinta-feira, 3 de março de 2022

Impasse




Vens vestida com aquele período concreto, 
Agora, que sou cada vez mais ria e silêncio. 
Não foste por mal, não é por ele que vens perto, 
Nem me chegas em pequenas peças de afeto. 
De que gostamos, nós, agora, 
Que não tenha o mesmo gosto incerto? 
 
Os dias, sempre novos, vão-se somando, 
Assomando-se ao futuro perfeito, 
Tão polido e, logo, imperfeito pretérito. 
Procuro, creio eu, algum conforto, andando 
Dentro do sobressalto que é a poesia, 
Esquecido, eu, de qualquer mérito. 
 
Ainda vives dentro daquele exato poema, 
Onde eu, precisamente, não te aprisionei, 
Já tão diferente, ainda com o mesmo rosto. 
O tempo certo demorou-se por ali, sem lema. 
Diria, mesmo, que por ali se aninhou, 
Por ali se esqueceu, sem perder o gosto. 
 
Todo o universo aparece tonto, 
Perdido entre os baralhos de signos, 
Os destinos das palmas das mãos, 
As coisas que não se veem nem te conto, 
As sortes de um conjunto de cartas 
E em fundos de chávenas de café e grãos. 
 
Sinto o prazer de uma ligeira dor na face, 
Desde o sorriso rasgado, ao olhar arregalado. 
O jantar vai sair do seu impasse. 


 [miscelânea] 
 [03 de março de 2022]