quarta-feira, 27 de abril de 2022

Asas




Descansa a gravidade sem importância. 
O corpo a ser corpo, o tempo a ser tempo,  
Para além do vinco tumescido da respiração de pé, 
Para além de seios a serem seios, não alimento, 
Não uma paisagem, não uma miragem. 
 
Prolonga-te um pouco nos meus subterrâneos, 
Com tua seiva mansa de carícias não prometidas, 
Que é sentir e estar e ser inteira e completamente. 
Permanece a base da base, o momento justo e cingido. 
 
Das palavras hidratadas, sem princípio ou fim, 
Podes roer o poema, no enredo da vida: 
O momento e o golpe, exatos, da mastigação, 
Como um ato de amor e de permanência. 
 
Espera-me, certa, uma madrugada desperta, 
Na sensibilidade da noite de um tempo curto. 
Os sonhos germinam no ar acordado e vigilante, 
Onde germina a guerra, como pesadelo de todos 
E vontade subtil de meros egoístas obstipados 
Por uma qualquer coisa que é apenas coisa. 
 
Estendo uma manta curva, o meu abraço, 
O gesto preciso e necessário para ser todo, 
O movimento certo para a continuidade. 
Um pouco mais acima, sem ser golpe ou o golpe. 
 
 
[miscelânea]
[18 de março de 2022]
 
 
 

2 comentários:

  1. Asas como meio de propulsão, como meio de proteção, como alimento. Um voo reflexivo, comunicativo, intenso: poético.
    Bjks

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  2. Mais um poema incrível, que nos faz mergulhar a pique na essência desta continuidade... a que chamamos vida... em todos os seus enredos, e maravilhas... mas também de golpes e degredos... por conta de alguns obstipados da ética, e de humanos valores...
    Sempre um gosto imenso, voar nas asas da tua inspiração!
    Beijinhos
    Ana

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