Perceber o frio dos teus olhos de Aveiro.
Gostaria de perceber esse frio intenso,
Que explicas com tanto frio, por extenso,
Em mim, ainda envolto na ideia do teu cheiro.
Concedo-te o gesto, mais do que um poema
Na poesia de que não sentes gosto ou tema,
O meu ideário de odor e das suas sementes.
Também sei que nós nunca seremos suficientes.
E nada, contudo, em tantas curvas, imenso,
E, ainda assim, o tudo do que pode ser brisa.
Sorrio com uma recordação, talvez, imprecisa,
Como uma recordação pode sorrir do que penso,
No tanto que a memória sorri e onde somos melhores;
Onde somos o bastante, maiores.
Escuto a mesma canção, numa nova versão.
Como de qualquer outra, como o que resta,
Nós nunca dançámos, ou abraçámos, ao som desta,
Mas, leva-me a ti, como o Inverno ao Verão.
Encontro, com a dificuldade de um ancião,
As imagens de um sorriso no teu rosto.
Talvez possamos salvar, ainda, agosto;
O pouco, ou nada, que te interessa, ou não.
E, contudo, a despedida.
E, contudo, a vida.
Aveiro é uma outra coisa, que já não somos,
E, como que a chorar, o violino não chora:
Lava-me um imaginário de alma,
Onde só existe salvação;
Eleva-me uma sensação de dor,
Uma dor incomensurável de ser feliz;
Leva-me ao frio do contentamento,
Onde não preciso de um abrigo.
Eu não preciso de rimas,
E, até, compreendo,
Sem necessitar de perceber,
O frio dos teus olhos.
Já a guitarra rasga bem fundo,
O arrepio de caminho, de arrepiar,
Sem medos, noutra melodia,
Sem mapas:
A vida.
[miscelânea]
[15 de agosto de 2022]