sexta-feira, 30 de novembro de 2012
Reconstrução
Organizo a realidade
Procuro as palavras
Fecho as arcas das palavras do trabalho
E que estão sobre as restantes
Para as dispor paralelamente
Com as outras arcas
E abro-as de seguida
Uma a uma
Todas as arcas das palavras
E de tudo o que sou
Saem todos os tímidos «olá»
Seguidos dos demais vocábulos
Que se juntam e separam
Gosto do seu marulhar
De repente a divisão fica escura
O ambiente arrefece e aquece
Sinto o espaço sem tempo
O sinal certo e a incógnita
Há muito de obsessão e de loucura
No ciclo de quesitos que são a própria existência
Assim como no acto de expectativa e de fé
De quem a venera e dela toma partido
Gostava de estar à altura
É extenuante sabê-lo
Como pensamentos e emoções sem valor absoluto
E materializa-se neste paradigma
Nunca virás por mim
Olho para a figuração da escrita
Que parece aflita
Mimo um poema magro
Que caminha sem rumo
Sem querer mudar de conversa
A sensação do passar do tempo é relativa
Existe a verdade e a mentira
A medida de tempo universal
Retoma a tensão
A inconfidência é um apanágio
Eu sei que me sentes
Importa-me
E brame em mim a doçura
Que acentua a natureza de sede e urgência
Ao abandono
Fico sem conversas
Fico envolvido nas ruas
Onde
Por vezes
Os afectos caem em desalentos
E esvaecimentos
Umas vezes explicáveis
Ou reparáveis
Outras
Não
Moderar
Não consigo organizar
Para além da dualidade
Da dicotomia
Sentimento
Razão
E sem ela
Desço os graus que me conduzem à cave
Estático
Os percursos da existência e insistência
Trazem tatuados a inconstância do impulso
E do vento
Das indecisões de terceiros
Trazem a certeza da fadiga
Produzem alternativas
E saídas
São compostos por alegria
Esperança
Fé
E tudo o que demais possuo
Trago um pouco de companhia
Palavras e termos
Promessas
Reminiscências e ofertas
Sentimentos
Sentidos e afectos
Sonhos
Vontades e desejos
Energias
Não só a memória é traiçoeira como
E também
As palavras
quinta-feira, 29 de novembro de 2012
terça-feira, 27 de novembro de 2012
Fortuna
Não poderás ler nas minhas mãos a sorte
De tão vazias
De linhas esguias
A minha sina levou-a o vento norte
Das minhas mãos o desejo apenas
Que é o desejo de todo um corpo
Permite-me que saia absorto
Da página e sem penas
Nem sequer fico na margem
Leva-me a aragem
Por mais do que uma noite e um dia
Mais do que um mero querer mundano
Mais do que unir o nosso corpo humano
Eu quero unir a nossa luz e a nossa energia
Na dimensão do desengano
Só para dizer [XXIX]:
Acredito que qualquer pensamento, ou frase, que possamos
produzir, ainda que simples, pequeno, puro, objectivo e concreto, tende a ser ambíguo
e/ou questionável para os outros.
Eu amo-te!
E hoje… (XLV)
… A vida continua. Abandono o meu corpo, dormente, e
viajo por caminhos indicados por pontos de luz e estrelas, movido por uma vontade
que vence as trevas desenvolvidas e que ludibriam o chão, de onde me ergo.
A decisão final é nossa, até que o último reflexo de
sanidade mental se apague, até ao último eco de discernimento, até que se desvaneça
o arbítrio. Nem tudo é legitimado pelo contexto.
quinta-feira, 22 de novembro de 2012
Serenidade
Num acto de reflexão,
Não de contrição,
O passado é apenas um fio,
Com muitos nós;
As rochas do paredão sussurram
Abnegação e bem-querer,
Num sinal que descodifico com alegria,
E sorriem.
É um sorriso que desbloqueia um mundo!
A vida vulgar prossegue igual,
O letreiro remete-me para o fim da fila.
Só nos meus devaneios é que a ria fala
Ou ri
E só neles o faz e apenas para mim.
A vida poderia ser um acto de amor contínuo,
Longe da senda parasitária.
terça-feira, 20 de novembro de 2012
No friso
Para cá dos cambiantes de luz e cor púrpura
Que tingem o azul
Possivelmente em data certa
Em local definido
Definitivo
O mar envolve o amor
Que brinca na areia
E constrói castelos
Que esse mesmo mar adora beijar
Em conceitos sem sugestão
Acaricia
E gosta
Sente o benévolo
Necessário e importante sonhar
Talvez a termo e a ermo
Um desejo
Para que a vida não seja um sono
Estéril
Ainda que as existências não se cruzem
sábado, 17 de novembro de 2012
Subo
Liberto versos que rimam
E palavras que te estimam.
Partem de mim várias ruas que são rios
E rios que são ruas,
Palavras simples e nuas,
E nuas camadas de desvios
Que contornam os baixios.
Segredam pontes que são tuas,
Que a ria espelha o meu reflexo
E que o segreda ao mar perplexo.
Salvo versos sem rima,
De várias cores.
Partem de mim vários rios,
E ruas, sem nome.
A ria, que já não é,
Olha-me com compaixão.
Dei-lhe a minha palavra de honra,
Dei-lhe as palavras de trabalho,
As palavras de obrigação,
As palavras de devoção perdida,
As palavras de lazer,
As palavras avulsas, avulso.
Dei-lhe as palavras adormecidas.
Dei-lhe as palavras da manhã,
Da tarde,
Da noite.
Dei-lhe as palavras que se perdem,
Que perdem o sentido,
Que perdem significado.
E dei-lhe palavras de um género de amor.
Se hoje fosse eu a ria,
Que sou,
Poderia não ter mais palavras,
Mas tenho,
E dedico-as ao Sol, à Lua
E a ti, amor, e amor.
segunda-feira, 5 de novembro de 2012
Convergência
Aceito, sem designação, a existência.
Mas não existem legendas para o que sinto.
Desconheço os motivos e se existem instruções,
Qualquer previsão ou antevisão de diligência
Para atingir as realidades tácteis, que pinto,
E para o cemitério repleto de ilusões.
As palavras choram enquanto despem emoções.
Choram letras de um alfabeto maior,
Que flutua em meu redor,
Com símbolos de quem se desconhece significações
Num espaço que medeia a aparência
E a relatividade da prudência.
Deveria soterrar os meus enganos,
Numa anuência,
E declarar e insolubilidade dos planos.
Perco o movimento.
Percebo que as palavras sonham de pé,
E que os sonhos também perdem a fé.
Hoje, não vi o mar, mas vi o discernimento
Que consegue realizar o irrealizável de um sentimento.
sábado, 3 de novembro de 2012
Breviário [XXXI]
Por vezes somos um hiato do silêncio ou o próprio som; por
vezes somos um projecto de qualquer coisa; por vezes «somos», ainda que o
contraditem.
sexta-feira, 2 de novembro de 2012
E hoje… (XLIV)
… A cefaleia mói suavemente, roça, em dor branda. Creio saber que não há forma de recuperar um dia, mas há forma de redesenhar o próximo procedimento, reprogramar a rotina e evitar a falésia adjacente ao registo esquecido numa base de dados analógica.
Um engodo de vida que se esquece e passa ao largo. Contratempo.
Por outro lado, sei que as estrelas e a lua estão nos seus
lugares, apesar de não as conseguir ver, ocultas pelas nuvens, que, também, não
se vêem, ocultas, por sua vez, pela escuridão. E é com esta certeza, de que
existem coisas que, mesmo quando não as vemos, sabemos que estão, lá ou cá, que
fico sereno.
quinta-feira, 1 de novembro de 2012
[Em pouco tempo, ou não…] IX – Crónica de um espantalho
Crónica de um espantalho
«É algo que faço instintivamente, observar a minha
desconstrução e ficar parado. Na realidade, na presença de seres humanos, não é
suposto que um espantalho faça alguma coisa, para além de ficar imóvel. Um
espantalho deve, acima de tudo, espantar os pássaros e ser agradável, o mais
possível, para os que lhe são seus superiores e criadores, sem fazer mais nada.
Basta seguir as normas de procedimento escritas por vários espantalhos de
tempos ancestrais e que constam em cânones antiquíssimos, de insuspeita
veracidade, para viver feliz. E pode sê-lo, com toda a simplicidade e
facilidade, se assim proceder.
Aos seres humanos, os criadores, cabe o papel de decidir
que vida terá um espantalho, não nas suas minudências, mas em traços gerais. Um
criador que destrói espantalhos que vivem ou choram deveria: sentir-se um
espantalho, sentir o peso das suas palhas e perceber com quantas palhas se
constroem os sonhos; promover a atitude de braços abertos, o proveito da vida e
o direito a essa mesma vida; garantir o direito à liberdade e à igualdade.
Os espantalhos possuem corpos frágeis e, nalguns casos,
almas sensíveis. Nós, os espantalhos, não somos todos iguais e há criadores que
são tão espantalhos como nós.
Por vezes enamoramo-nos por seres humanos, assim como os
seres humanos também se podem enamorar por espantalhos e, nessas
circunstâncias, num verdadeiro amor, não existem seres superiores ou seres
inferiores. Mas, se há histórias de amor sofridas, mesmo entre espantalhos, da
mesma forma que entre os seres humanos, as histórias de amor entre seres humanos
e espantalhos são sempre histórias de amor impossível.
É
normal que um espantalho permaneça só, mesmo só, durante a vida, por opção ou acaso.
Da mesma forma que pode ficar temporariamente só, ou pontualmente só, ou escolher
estar só. E o que pode fazer um espantalho quando está sozinho? Eu faço muitas
coisas e muitas, coisas, vos poderia acrescentar para explicar o “estar”, o “ser”
e o “ter”.»
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