domingo, 12 de janeiro de 2014

o amor romântico foi proibido





há um trilho de ausência no horizonte que já não vejo
uma total carestia acidental que não prevejo
em memórias que com as mãos quero agarrar
produzidas por calafrios e carências
resoluções e desígnios e falta de referências
uma arrelia cósmica que me alheia e isola
em prazo que é premente milagre e esmola
que não é nada para os de fora de mim
e é tudo para o que eu sou e o fim


   

sábado, 11 de janeiro de 2014

à minha atenção




reinvento-me com as minhas sombras por perto
entre a multidão curvada e preenchida de certezas
nos espaços vazios
nos elementos em rigores de inverno
no inverno em rigores de sensações
no recôndito do peito
na ponta dos dedos
na ponta da língua
mas para mim serás sempre ria
embora também te chame laguna
escondida ou exposta nos meus escritos
com muitos outros termos
por outras palavras
noutros sinais
em algo novo




sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

fronteira oblíqua

  


guardo memórias
não reservo rancores
por sentir na própria pele
no menos bom ou no melhor
do melhor ou do não tão bom
o ameno e o agreste
em qualquer sentido
num qualquer extremo
relevo ou reentrância
a temperatura ou o toque
nos seus vários gradientes
pele a sentir na própria pele
a minha pele despelada
sem pele a minha alma



quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

tenho os meus fantasmas cuidados




permite-me que seja cidade na tua cidade
conheça todos os seus sentidos
me misture e difunda no seu ar
me entranhe nos seus odores
nos seus sons
nas suas cores
que seja parte do seu calor
do seu âmago
tomando em mim a sua e a tua dor
tenho os meus fantasmas cuidados
carrego apenas a laguna
e a laguna é continuamente poesia de água
que se lê infindavelmente de forma diferente
num insubmisso e ímpar êxtase



quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

um poema que quer voar e tombar extenuado



passeio pelas minhas palavras e silêncios
em silêncios e palavras que me fogem
não encontro os versos bonitinhos
com brocados ou cornucópias
ou que falem de flores puras
de arbustos imaculados
de querubins rosados
de cânticos felizes
de afecto perene
do absoluto
nada

não encontro os versos luxuriantes suspirados
que gemem baixinho por prazer com prazer
com suspiros providos de clarividência
de toque lânguido e olhares lascivos
vejo as mesmas palavras rigorosas
em versos de ar desgrenhados
sem oportunidade para florir
sem tempo para encantar
embora autênticos
desabrochados
de pé

as aparências saltam das molduras
para assistir ao propósito insólito
quando os versos em união implícita
se preparam para atravessar a rua
agrupam poemas para serem um só
sociabilizam as palavras indomadas
para serem eles o todo deste vazio



terça-feira, 7 de janeiro de 2014

demarcação




eu e os suspiros roliços da vazante
numa enchente de harmonias casuais
em confronto com a lamúria ululante
da saudade no colo do amor absorto
e dos sargaços em danças vertiginosas
que se projectam ao sabor da corrente
na água zurzida pela lhaneza do vento
num prenúncio de viagem oca e rude
sob os olhares luminosos da nostalgia




segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

moliceiro enraizado

  
  

chovem recordações no monte farinha
lembranças imprevistas e abruptas
que ocupam os meus pensamentos
por vezes repetem-se como uma ladainha
mensagens e palavras incorruptas
que não pedem consentimentos
memória de outros e tão minha

reminiscências que se precipitam
em abraços que se protelam
e em gritos abafados e obstados
promessas submersas que se creditam
nas horas que aguardam e se rebelam
chovem recordações de fios rasgados
na noite que fende sobre vagas que militam

numa chuvada de reflexos súbitos de cidade
que se dirigem para a sarjeta das certezas
no ambíguo do afecto que é saudade



domingo, 5 de janeiro de 2014

emerso

  


sem conhecer o porvir da maré
as minhas emoções são um embargo
é hora de fechar um capítulo solto e livre
tão meu e eu
independentemente do ano
sem promessas ou enganos
importa o quê e quem
manifesto sem brilho no céu cerrado
num registo plácido e liberto
enquanto tangível
não é de ninguém
deixo-vos o tempo solto



sábado, 4 de janeiro de 2014

desumanização





a insistência da luz ténue para lá do monte 
do sol que rompe a linha do horizonte 
onde esboça uma forma irregular e polígona 
relembra que ninguém chorou por antígona 
enquanto as suas memórias brancas e já frias 
sedentas de palavras e de companhias 
escorriam pelas paredes da gruta 
movidas por uma carência abrupta 
e desenhavam trilhos de equidade 
até ao esquecimento da saudade 
entre mais embargo embargado 
num suspiro lento e sussurrado 
o efémero por vezes é tão longo 
e acompanhado pelo som do gongo 
num mar que substitui a areia na ampulheta 
hospedada numa simples e eterna grilheta 
quando fora do foco da flor vive beleza da planta 
aquela que verdadeiramente encanta 



   

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

um pouco antes a vida seguiu o seu curso


  
é explicado por uma porção de mar da lua
pela honestidade de um caranguejo alado
e pelo arco do tempo que se acentua
sustenho a respiração
sinto o pulsar no meu rosto gelado
aveiro regressou dos vagares do passado
a chuva deixou no ar mais chuva e reivindicação
laguna entre escolha e possibilidade sem brado
e mais chão do meu chão molhado


   

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

em passos de sorriso e sentimentos sem termos




a caminhada deixou um rasto de saudade pela marginal
a cada passada a expectativa de conseguir avançar um pouco mais
por entre as sombras de votos por enviar sem qualquer manifesto motivo
que não o do evidente distanciamento e a condição de estranho
que se misturam com o odor da areia molhada pela chuva e pelo mar
e com o odor doce das memórias que não pertencem a qualquer lugar

o dia não rima com o travo do céu que escorrega no dorso das rochas
onde também se aninha o murmúrio das ondas de sonhos sem tempo
em tempo de urgência sem forma e que se extingue em espera
mas não é triste nem tristeza o ambiente que cinge e recheia
a sombra embargada que a luz colou ao meu corpo não me projecta mal
inclui-me em equilíbrio para além do invisível e do temporal
em passos de sorriso e sentimentos sem termos


    

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

de maneira que talvez para ser eu e igual



quis ver nascer o dia e as palavras que com ele nasciam
todos os dias nascem diferentes as mesmas palavras
no momento fugaz em que todas as águas param e se silenciam
no instante fugidio e incerto em que dormem
mas no burburinho do meu marulhar não o percebi
e já é dia fora há algum tempo
e já são novas estas palavras que tem quase o mesmo gosto
embora à nascença mais frias do que em agosto
falam de um poeta que pereceu várias vezes e continua
sempre tão lenta e distintamente e em pesar sorri
encontrei a razão despida que havia perdido de forma crua
a minha não a tua
cada um de nós é um dia depois do outro
com as mesmas palavras que podemos conjugar de forma diferente
de igual forma que com os mesmos silêncios
em possíveis entendimentos diversos e dispersos e distantes ou iguais
para que cada um possa ser quem é e talvez sem se encontrar