terça-feira, 22 de agosto de 2017

Umas semanas depois




Por vezes, iludo-me. Penso que já não sou exactamente 
eu, precisamente o mesmo. Mas, o que mudou foi aquilo 
que ficou e o que partiu, ou a suas imagens, e os reflexos 
de estar sem ser e de ser sem estar. Compreendo o saldo 
do amor como um sorteio da poesia num instante preciso 
e, contudo, alegórico, de ventos mais ou menos pacientes. 

A janela abre-se por dentro, no cérebro, e o seu tempo 
não pára, como no caso do tempo das ruas, que quase 
ficaram na sua época e agarradas a um nome de acaso, 
por obra do mesmo, acaso, e que lhes guarda a sua 
ímpar distância, quando um homem não as emaranha 
numa nova vida, para castigar as memórias dos vivos. 

Sempre que olho para a ria, vejo que nunca daqui saí 
e reparo na minha mais natural sugestão de apresentação: 
um fogo, uma terra, um ar, uma água, um metal: líquidos 
e simples, que, podendo estar em qualquer local, são 
de um ponto único, de lugar nenhum e de toda a parte. 
É este o regresso à casa de partida e os dados são aéreos 
e estão, fantasticamente, viciados. 


 [sobrevoo]



4 comentários:

  1. Os dados estão sempre viciados...
    O saldo do amor é sempre negativo
    A união é sempre breve e por isso nunca existiu.

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  2. »fantasticamente, viciados« amei! Poema muito lindo.

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  3. Há lugares que nunca saem de nós... mesmo quando somos nós, que saímos dos lugares...
    Os dados estão viciados... pois não se pode regressar, onde já sentimos que sempre estivemos...
    Mais um trabalho belíssimo, Henrique! Parabéns!
    Beijinhos
    Ana

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  4. O momento é sempre preponderante para as conclusões, creio que será uma das ideias subjacentes, o que vai de encontro à minha dificuldade em decidir sobre o que dizer, ou destacar. Sei definir que gosto, que me é agradável. :)
    Bjks

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