segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Choque frontal




Olho, outra vez, e já não estás. Ficou como que uma teia 
de névoa: o nosso tempo não se encontra; o momento 
era o beijo e o abraço, imaginários; tu querias tudo 
e tudo era no exacto instante do tudo que eu não podia 
porque, eu trazia a realidade da distância colada ao corpo 
e, pior do que trazer o verão no teu inverno e o inverno 
no teu verão, eu trazia o outono na tua primavera e as flores 
da minha primavera não rematavam o teu rigoroso outono; 
o meu futuro era um sítio diferente, encontrava-me em ti, 
mas perdia-me do teu; levantei muros e pontes inacessíveis, 
quando levavas o vento e a intenção de um horizonte que trazias, 
para lhes repararmos as linhas que não existiam, nem podiam 
existir; eu cruzei e construí discursos, cada vez mais, formais 
e, no enredo de todos os fios de pensamento, a bateria ficou 
fraca. Olho, outra vez, e já não estás, de novo: choque frontal. 


 [miscelânea]



2 comentários:

  1. E a vida, é mesmo isto... feita de desencontros, em desencontros... que nos conduzem a lugares, situações e pessoas, que nunca havíamos sonhado, que haveríamos de chegar...
    Adorei este poema brilhante... que irei fanar, qualquer dia, para o destacar lá no meu canto!... :-D Vou já avisando... para não ficares chocado!... :-))
    Beijinho
    Ana

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  2. Há sempre o mistério do que possa ser real ou imaginário, naquilo que leio, mas sente-se uma deliciosa frontalidade neste poema. É soberbo! Parabéns!
    bjks

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