aveiro | portugal |
já havia pais natais de chocolate nas prateleiras do
supermercado.
pareceram-me mais sisudos do que aqueles que tenho na
memória.
mas a memória doeu-me enquanto, ontem, passava a ferro as
dez
camisas, o conjunto de lençóis e os três pares de calças,
que viviam
no cesto da roupa lavada. dores que dobraram ao dobrar os
muitos
pares de meias, que, também, por ali habitavam. as cuecas
ficaram
para mais tarde. havia muita poesia nelas e não a quis dispersar.
também não quis trocar, e retive, a emoção do peso da
palavra: cuecas.
caiu uma subjectividade persistente durante toda a noite,
gotas de relativismo que conferiam brilho ao asfalto e
aos passeios.
a cidade quase não dormiu, à procura de uma forma desconhecida.
senti a pulsação secreta da ria, à procura de
competências sensoriais
nas minhas aptidões cognitivas e em tanta coisa para ou
por dizer.
tanta coisa nos meus gestos e no meu reconhecimento de
ter, e ser,
parte de uma substância perecível comum, universal, e epistémica.
talvez tenhamos mudado a nossa hora, só não sabemos em
que sentido.
tomo a tua direcção, na preguiça do sol que bate à minha
porta.
hoje, eu não consigo fugir do tempo e fingir, ao tempo,
que tudo está
bem nos cheiros do meu quarto e nos dedos que se soltam
no, e depois do,
vazio. há sombras que esperam deste lado das paredes e
que nunca irei
abraçar, apesar da sua espessura e de procurarem um nome para
nós.
abre-se a porta e entra o gato, que trás a luz da rua
para me beijar a intimidade.
o mundo não acabou. abre-se uma janela, onde não se
enquadra a minha memória.
eu não consegui morrer-te, comecei a recordar-me de mim, daqui
até à brisa verde.
[o significado do silêncio]
Fiquei pensando... o que foi contigo... e o que se perdeu?
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