sexta-feira, 23 de outubro de 2015

outubro


aveiro
aveiro | portugal



eu fico por aí, muito tempo, na privacidade da ria. 
gosto de observar o seu despertar, tão sem regras, 
quando o seu sorriso ainda é transparente e carinhoso; 
quando os seus gestos são uma dança intrínseca, 
a própria melodia, e propagam os aromas e os afectos. 
depois, cada um vai à sua vida e já não há como continuar. 
o regresso é sempre um recomeço dúctil e contingente. 

a ria acredita que o outono é de ouro que se espreguiça 
e que, mesmo quando verde, ela própria será sempre azul. 
acredita que há caminhos de palavras inventadas em sussurro 
de calorosos actos de amor (que talvez já não o seja); 
e eu, que são as palavras que decretam, não só a urgência 
do tempo e a intimidade do espaço, como a existência 
de todas as ignorâncias, na incapacidade de se ser mais além. 

o segredo, de alguns canais, é a impaciência na paciência dos versos; 
é o esperar que o lugar seja sempre o mesmo à chegada. 
a minha senda é a paciência na impaciência dos versos; 
é saber que à chegada é sempre outro o lugar; 
não esperar que o amor se anuncie com o desarrumar da água, 
ou que este perdure sem o generoso embalo de um seio.  



[o significado do silêncio]


2 comentários:

Obrigado, pelo seu comentário!