sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Etéreo


O plano, o período e o clima não eram os melhores, com certeza.
Acredito que, desde o pináculo, seja difícil vislumbrar o detalhe,
Vincado e preciso, do pesar e da aflição de um olmo desamparado,
Sem projectar sombra e em atmosferas arredias da inteireza;
Sem cobertura, sangrado por um profundo e amplo entalhe;
Agarrado a uma peculiar circunstância de ter raízes e estar deslocado.
Não foge, enquanto os salgueiros, amigos, com celeuma, o vergastam,
Aparentando dar palmadinhas nas costas e que muito se agastam
Com o seu involuntário abrolhar extemporâneo e desfasado.

Desfolho a complexidade digital, crítica, crónica e criativa,
Escrita e descrita nas folhas caídas dos azevinhos de várias eras.
Folhas molhadas que pululam no chão de terra, que as anseia.
A vertente não tem cilada e o pequeno vale espelha a prática incisiva,
Essa sim, natural, sem juras artísticas, de verdes esperas;
De prodígio, de sobrevivências incólumes, que não se maneia;
De atoleiro de verbos, boçais, abandonados e depositados por enxurradas
Há muito tempo esquecidas, há muito tempo choradas;
De alinhavos de sátira que, encoberta e renunciada, se refreia.

Os fluidos do ribeiro deixaram de ser acromáticos, inolentes,
Para abarcar os tons e odores ditados pela tua indústria exuberante:
Frases que serpenteiam, sob aplausos e ovação, sobre os seixos angulares.
Na região dos elos fraternos eternos, dos sempre presentes,
Os laços de alforria estão enfermos e de utilidade inoperante.
Os atlantes, debaixo das cornijas, são uma baganha seca de olhares.
A desusada deusa azenha exibe, apenas, uma amostra de quatro muros
De adobes de saibro, subjugados, erodidos e pouco seguros.
Emparedados pelo capim bravio, espontâneo, semelhante a esgares.

Em abono da minha convicção, nunca deixei de ser poeta verdadeiro.
Choro quando choro, sem carpir; sem a modéstia de imitação, pintada ou caiada.
Sem dúvida, todos os vocábulos contêm disfarces de diferentes espessuras,
De diferentes opções e credos. Não creio que não tenhas reparado, por inteiro,
Na falta de freio das rimas estreitas, das escorreitas, das indigentes; na chegada.
Os ensaios de duvidosas diplomacias, vindos em nodosas e dengosas lisuras,
Cobram os dízimos vencidos, baseados em pressupostos de proprietário
Zelador e guarda-mor da etiqueta moderna, também, ele, um operário,
Construtor de altares, de pedestais; de torres, de ameias. De alturas.

O que, normal ou ocasionalmente, pensam as austrálias ou os eucaliptos, eu não sei,
Nem sei o que realmente querem dizer as trepadeiras aos álamos esquecidos.
Contemplo a beleza da natureza, mesmo quando não entendo a sua cruel brutalidade,
Sem esquecer que, eu, também, sou um elemento natural, simples e com lei.
Não respondo à fonte inquinada, que nada me diz, nem me dirige os seus pedidos.
Trago comigo, contra todos os pareceres e anacronismos, a inata antiguidade
De estar grato com a vida, ainda que amargo, copioso ou longe da grei.

31 de Dezembro de 2009.

7 comentários:

  1. Bem...

    Lá está o que eu dizia anteriormente. Para este post eu necessitava de uma análise linha a linha.
    E mesmo que eu fosse ali buscar os óculos para ver se via melhor, analisasse linha a linha, de dicionário em punho em busca de sentidos escondidos, descobrindo as palavras novas que aqui vou aprendendo tenho a sensação de que não conseguiria retirar o conteúdo correcto que pretendes transmitir.

    Falha minha :D

    Henrique, que este Natal seja para ti, num sentido figurado, etéreo!!!

    Um beijo

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  2. Este é denso, mas, recomendo-o (embora fruto de uma dimensão e divisão "amadora")! Para ler com muita disponibilidade (de tempo, de espírito, de intelecto).
    Não tens qualquer falha, salvo seja!
    [Pressinto (- sem precintar - não estou a querer dizer que existe inequivocamente) algum desconforto em expressares o que sentes, e se assim for sê-lo-á por minha culpa. O meu pontual e incisivo desacordo, em relação a algumas interpretações, está relacionado com o facto de eu não pretender que se reduza a poesia, somente, à individualização, à personalização, à particularização, ou ao domínio do autobiográfico puro e duro, a uma linguagem de diário. ;)]
    ;)
    Não é para rivalizar, mas, porque o sinto assim, puramente: Que este Natal seja para ti um misto de sentido poético e figurado de etéreo.
    Beijinho

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  3. :D :D

    Pressentimento desda vez errado.

    Aqui a teimosa, leva a escrita, seja ela de qual genero for, sempre para o lado pessoal (mesmo que seja o pessoal de outrém).

    É defeito de fabrico, a minha mãe bem que tentou mudar-me mas já desistiu. :D

    Por isso, sem desconfortos te digo que levo tudo para esse lado e também levo tudo muito a peito. Arranjo sentidos nas palavras dos outros que nem os outros imaginariam que eles lá pudessem estar.

    Isso faz-me dar passos em frente e recuar depois para avançar mais tarde. Não é desconforto. O teu pontual desacordo só me dá luta a mim para fazer vincar as minhas persistentes opiniões :D:D

    E hoje, estou que estou a "falar" pelos cotovelos,... é o Natal! :D

    Beijinho

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  4. :D
    Não tarda está na minha hora de tomar as gotas.
    :D
    Sinceramente, já me ri bastante! Obrigado!
    ;)
    Beijinho

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  5. Este! Li-o e interiorizei-o creio, mas tem muito que se lhe diga. Tem de ser lido com mais calma, com a minha net activa e com o afinco e a precisão que merece embora eu tenha por vezes o "condão" de ver coisas, de as ler e de as sentir como minhas não sendo. Vendo significados e associando a passagens que me lembram outras... Enfim como digo a ler!!! Aturadamente e já pus um visto nos meus "obrigatório reler com mais atenção e esmero" a sério tu tens uma possibilidade extrema, uma linguagem quase erudita a raiar a perfeita se +é que eu não diria mais que perfeita...Brilhante. Ler-te continuo afirmar deveria ser obrigatório. É "escola" é aprendizado é cultura e autêntico pasmar no bom sentido. Henrique digo-o e afirmo bendito o dia em que te conheci através da Sol outra querida... Sou afortunada de poder ler-te digo de coração nas mãos! Beijo grande e Feliz Natal, não sei bem quando posso falar mais livremente com a minha net de volta mas prometo que (não leves a mal é a brincar...) Não me escapas!!! De te ler de novo neste poema... Noutros está prometido. Abraço, tudo de bom.

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  6. Deixas-me sem palavras, embora continue consciente da minha realidade e conhecedor do meu lugar. Obrigado, amiga!

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