terça-feira, 31 de maio de 2016

com um seixo à cabeça


aveiro | portugal


faço deste tempo o de brincar 
no rossio, junto à ria, agora amuada, 
e voo como nunca voei, assim, tão pardo. 
sou amigo das gaivotas, derramo azul inofensivo 
no céu tão pronto e perto de cair sobre as palmeiras, 
os meus pinheiros gratos, debaixo dos últimos raios de sol 
que leva o seu tempo a chegar na última ilusão de liberdade. 
o rossio mantenho meu do meu tempo de brincar. sou o degrau 
a ver passar quem não passa por inteiro até à água do ancoradouro 
e regresso ao voo de onde nunca se regressa o mesmo, mesmo a tempo 
de ter o último olhar que rebola na tua pele utópica à luz do dia. adormeço 
a história que aqui um dia dormiu no meu peito céu azul risonho e cama amena. 



 [elipse]


segunda-feira, 30 de maio de 2016

com o dia na proa


aveiro | portugal


se os dias os braços nos encolhem e para o céu olhamos em súplica 
como árvores, poderemos sorrir, também, para encurtar a distância 
que nos separa da auto-indulgência. qualquer resquício de alegria 
aviva a cor mais mortiça, até porque, o céu cai mais fundo na escuridão. 
sei que isto tem um certo sentimento, um certo gosto, um certo ar, 
uma certa textura, um certo odor cliché, sempre ao sabor da maré. 
mas poderemos, ainda assim, celebrar a saudade e a nostalgia, 
com uma garrida frase brejeira e um erro ortográfico, na proa. 


 [elipse]


domingo, 29 de maio de 2016

meia ponte no céu


aveiro | portugal


lembras-te? o mundo efectuava as grandes estreias em nós. 
entre a amabilidade dos elementos, traçávamos a bissectriz 
do ângulo recto e ascendíamos às fantasias siderais da voz. 
o vento, uma oitava abaixo, cobria os nossos passos por um triz, 
no ponto mais saliente da nossa tenra e ruminante castidade. 
sempre existiram nuvens, a desdobrar sombras de quebrantos na cidade, 
húmida em todos os endereços, e de líquida matriz; 
meia ponte, no céu, de asas dadas com a liberdade,
onde um anjo desce à procura de um corpo feliz, 
em véspera de noite, na febre de procurar a directriz. 
noite, onde os sonhos já flutuam, próximos da eternidade, 
algures entre a memória, o destino e a invisibilidade. 


 [elipse]


sábado, 28 de maio de 2016

horas excepcionais


aveiro | portugal


num fantástico relâmpago anatómico, 
este sábado não esteve tão avenida 
e a avenida não esteve tão musical. 
mas não importa o sábado, ou a avenida, 
a uma corola de horas que entra na chuva, 
aqui, onde a esperança corre debaixo das pontes 
numa imensa desarrumação de reflexos 
e numa desafogada dança líquida. 
se não venho acrescentar valor a este quadro, 
que não o subtraia de qualquer forma. 
e dividi-lo: só se for por partilha. 
quem ama o que ama, arde até ao fim, 
em horas excepcionais, sem incinerar primeiros, 
segundos ou terceiros. 


 [elipse]


sexta-feira, 27 de maio de 2016

um dia inclinado


aveiro | portugal


as janelas, que não aparecem; 
o relógio, que foi receber horas; 
o poema, que foi despejar o vazio. 
ou, um dia inclinado que juntou janelas, 
relógios e poemas, e foram ser felizes, 
connosco, no desvairo do universo. 
no reverso, um anjo afável, de granito, 
com um rosto de outro planeta, 
que distribui uma mão cheia de lua 
minguante, para enternecer as sombras. 


 [elipse]

quinta-feira, 26 de maio de 2016

imagino-te a entrar no poema


porta de alegrete [do século XIII], portalegre | portugal


imagino-te a entrar no poema, na parte onde 
me consigo resguardar e, que já tem a porta 
aberta. já sabes que eu só fecho a porta dessa 
parte do poema, onde estou, quando vou dormir, 
ou quando não posso estar por ali, acessível. 
dás atenção, seguramente, à substância e à arrumação. 
sou imaginária e poeticamente abastado e genuína 
e materialmente modesto. o asseio sou eu que o faço, 
mas não esperes encontrar tudo meticulosamente 
arrumado. eu vivo em todo e por todo o poema. 
há sempre umas palavras à mão, eventualmente 
uma ou outra já usada sobre uma mesa, ou noutro 
ponto ou vírgula ou sinal de pontuação, ou sem eles; 
e bastantes, e em quase qualquer lugar, disponíveis 
para um acto de leitura, sob várias formas e formatos. 
sim, eu não estou em tudo, e muito menos, sou o centro 
do mundo. imagina-me dentro do poema, que podem 
apelidar de pop, enquanto entras. poderás, de surpresa, 
encontrar-me em exclamações e interrogações, 
num ruidoso silêncio, sobre a sua utilidade e sobre 
a utilidade de tudo o que já escrevi ou venha a escrever. 
imagino-te a entrar no poema, 
a utilidade de tudo o que já escrevi. 

 [elipse]

quarta-feira, 25 de maio de 2016

relógio


aveiro | portugal


há uma ideia inflamada e sobre a infantilidade do «eu», 
do «eu» como estigma de pobreza paisagística e literária 
e de qualquer «eu» alternativo que não seja o seu. 
pois, eu diluo-me num tempo facultativo, que passa 
clandestino sobre tudo aquilo que já esqueci 
e que se equipara a tudo aquilo que desconheço. 
a cidade parece ainda mais pequena no ar salino. 
o relógio da sala perdeu-se na contagem do tempo, 
entre horas imaginárias e sequências de alheamento. 
um movimento mecânico e solidário para com o destino 
das horas expiradas. mas não é esse o vazio que sinto. 


 [elipse]


terça-feira, 24 de maio de 2016

as janelas da elipse


aveiro | portugal


as janelas parecem não ter mudado de estação, 
apenas a luz mudou a diagonal, talvez à procura 
de algum sentido ou da invenção de um sentimento 
e eu procuro não sei bem o quê ou se, na realidade, 
me esforço para não encontrar, de todo, o que seja. 



 [elipse]


segunda-feira, 23 de maio de 2016

foz




pinto-me com uma sombra, 
onde chegam alguns raios de luz. 
as decisões correm para o mar, 
não há quem resgatar, 
não há ninguém para as trazer de volta; 
não há quem me resgate. 
não fico a lamentar-me, não me lamento, 
não é um lamento. 
pedir desculpa de quê? 
chegar à foz é um possível final feliz, 
e eu estou a chegar. 
eu estou quase lá… 


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(fim)


domingo, 22 de maio de 2016

solidão - actualização.


portalegre | portugal


estou convencido de que, a pior das solidões, 
aquela que mais nos corrói, é a que ocorre 
quando não se está, efectiva e afectivamente, 
sozinho; aquela à qual nos sujeitamos 
por aparentar ser a escolha mais assertiva; 
aquela que atravessamos inteiramente 
lúcidos e por inteiro. é a nossa própria pele. 
através dela, tudo, em redor, se torna 
mais espesso e incessível. entendo que, 
com o tempo, se possa sucumbir, 
quando sucumbir é a derradeira esperança 
e aparenta ser o caminho; ou, que, para aliviar 
a amargura, se invente um mundo melhor 
e sonha-se… 


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sábado, 21 de maio de 2016

com um poema


aveiro | portugal


com um poema para ficar junto à ria a adicionar gestos 
e rascunhos que me descrevem na margem e me passam 
para a água, eu quero ficar aqui, eu quero ficar aqui. aqui, 
no mais próximo que tenho de mim; aqui onde a primavera 
me pode encontrar a florir numa espécie de fé em ti. 


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sexta-feira, 20 de maio de 2016

as memórias da pele


aveiro | portugal


as memórias da pele na flor da alma que balouça nas ervas, 
o emaranhado da minha loucura aglomerada inerte a uivar. 
vibrações que se virgulam em mim e que vêm com o vento. 

a música atravessa-me as fronteiras e trespassa o meu corpo. 
há notas que me ficam em lugares que eu desconhecia, 
onde não me encontro. daqui se vê a cidade que já não existe 
e procuro um poema para explicar qualquer coisa sobre nós 
ou para mostrar os alicerces das razões mais profundas. 


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quinta-feira, 19 de maio de 2016

da parte silenciosa dos dias


praira da barra- ílhavo | aveiro | portugal


gosto da parte silenciosa dos dias, 
sem hora certa e sem local definido, 
que a pele também conhece, 
e gosto de me desperdiçar nela. 
mesmo quando essa parte está prostrada 
aos caprichos das gaivotas, ou de uma 
qualquer planta orvalhada. 
pode não ser, exactamente, o silêncio, em silêncio, 
e a nossa presença pode não ser necessária. 
já a encontrei na secção dos congelados, 
entre favas, ervilhas e castanhas piladas. 
mas foi em ti que mais me arrepiou, 
quando olhei para os teus pés com amor. 


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quarta-feira, 18 de maio de 2016

sem moldura


portalegre | portugal


as palavras também tacteiam no escuro, 
com uma vontade milenar de alcançar. 
não me alicia o conhecimento de algumas 
palavras não ditas, aquelas que, pela sua 
natural inércia, perderam a oportunidade, 
e que, por vezes, surgem furtivas, tarde, 
pintadas de inocência. 



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terça-feira, 17 de maio de 2016

transparência carnal





examino a parte concreta do sonho, 
observo a peça consistente do teu nome 
e analiso a ausência dos teus gestos, 
para os quais invento umas mãos. 
das linhas das minhas, surgem as palavras 
relacionadas, seriamente grávidas: 
não há uma tristeza para estancar. 
na contracapa dançamos em corpo, 
ao ritmo de uma melodia azul, 
nos mistérios penetráveis do espaço 
e na assimetria do tempo. tudo poesia. 



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segunda-feira, 16 de maio de 2016

a minha poesia


aveiro | portugal


por vezes, chamo por ela, a poesia, 
e ela vem, sem saber ao quê ou para quê. 
outras vezes, é ela que me chama e eu vou, 
nem preciso de saber por onde, para onde. 

as bruxas retribuem-me a descrença. 
a minha poesia não tem corrente, 
nem doutrina; creio que, nem destino. 
mas tem muita electricidade e é condutiva, 
e, como se fosse uma verdadeira divindade, 
está em tudo e anda por todo o lado. 
mas sem estar e sem andar. 

é com se estivesse no corredor do verão 
com um enorme bando de pássaros, 
de várias espécies, pousados nos ombros. 


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domingo, 15 de maio de 2016

mergulhar na noite


aveiro | portugal


vi uma outra festa, o sporting foi um campeão impossível. 
eu recebi a intimidade da noite simples e sem litoral, 
onde circulo por extenso, nos seus labirintos de silêncio. 
o mundo respira. o teu nome é a minha senha de entrada. 
o teu corpo surge acompanhado por lugares inacessíveis, 
por uma loucura sagrada, que recebo em especial emoção, 
e as suas zonas de sossego são cercanias de frenesim. 


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sábado, 14 de maio de 2016

sair do sono


aveiro | portugal


há dias de ócio que já nascem prometidos 
a uma carga de trabalhos. e, entre despertar 
no bulício das palavras, ou acordar no burburinho 
dos sentimentos, ou sair abruptamente do sono, 
envolvido em vórtices de emoções e vocábulos,  
penso em ti e em como as minhas mãos te vêem, 
sílaba a sílaba, enquanto o sol se ergue, sedutor 
e como um fogo frágil, que alimenta os nossos tons. 


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sexta-feira, 13 de maio de 2016

durante o sono


aveiro | portugal


no letargo da noite, emerge o teatro de sombras 
que nos dissemina entre universos e fantasias.  
não sei se haverá alguma fé que nos possa valer. 
as letras soltam-se das palavras. misturam-se 
com certos sentimentos que vem acompanhados 
de porções de tempo, lugares, coisas, pessoas. 
a natureza planeia baralhar os sinais das tribos, 
que adquirem uma nova verdade com a distância. 
geralmente, as noites não são exactamente iguais 
e tudo pode acontecer entre o sono e a vigília. 
um bom sonho pode ser uma breve recompensa 
e, por vezes, estás neles, fulgente, fundamental. 
tens, certamente, as tuas razões para aparecer 
assim. razões que são, possivelmente, a minha. 


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quinta-feira, 12 de maio de 2016

no exacto momento de adormecer


fotografia de grafite, águeda | aveiro | portugal


surge a tua imagem. observo as primeiras palavras. 
não é o teu nome, são os afectos a adquirir formas 
de letra, com as sensações crescentes e o instinto. 
na parede, que não existe, projectam-se as sombras 
dos nossos corpos. brotam flores dos meus dedos. 
estás, na humana dimensão do eterno, em mim. 


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quarta-feira, 11 de maio de 2016

antes de adormecer




consulto a conta-corrente das emoções. respiro. 
fico na sedução da parte fértil do teu nome. 
fito o segredo do teu rosto oculto noutro silêncio, 
onde desenho carícias amparadas e constantes. 
saio pela margem do papel, num corpo a corpo 
sentimental. antes de adormecer com as pontes. 


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terça-feira, 10 de maio de 2016

tu estás


aveiro [rossio] | portugal


tu estás lentamente em mim, 
como a subtileza da ausência convencionada. 
há palavras por dizer, que caem como as folhas 
da vegetação. levam consigo um certo silêncio, 
que traz à tona uma imagem cansada e dorida, 
e a fragilidade da cidade à margem dos canais. 

hoje, não há quem varra as palavras do jardim. 
por isso, há um espaço inquietante no silêncio; 
um limbo em que os afectos se amalgamam; 
uma lembrança esquiva, sem contexto e imprecisa; 
uma esperança furtiva de aprendizagem volúvel. 
um fragmento de silêncio que magoa, levemente, 
com a sua parte mais luminosa. mas, não há tristeza, 
em mim, onde continuas, demoradamente. 


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segunda-feira, 9 de maio de 2016

inexistência imprevista


meia laranja, praia da barra - ílhavo | aveiro | portugal


desconheces a origem da tristeza e da angústia
que te assaltou o dia como uma onda interminável
e que te deixava como espuma dispersa na areia da praia,
exposta aos caprichos constantes do vento quase táctil.
a tarde desliza, célere, para o outro lado do paredão,
enquanto ondulas nos seus gradientes terminais:
o horizonte mélico, da aparência ao som, que tomas
como paliativo.

crescem umas derradeiras palavras num afago
de tempo que te trespassa como se fosses ar.
uma inexistência que não previas.


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domingo, 8 de maio de 2016

é quando




é quando, também, o maio me cai líquido e celeste 
sobre a carícia inacabada de um poema incompleto, 
que eu vejo o modo condicional da intimidade 
a desaguar no gesto da escrita que te procura. 
não tenho sido um bom autómato, sistema central, 
e, obstinado, alegra-me que nunca venha a sê-lo. 


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sábado, 7 de maio de 2016

encontrar o ritmo


portalegre | portugal


encontrar o ritmo táctil e o refrão das tuas mãos; 
conhecer o encantamento e a carícia dos teus lábios, 
alcançar o rumor e a conversação dos teus beijos… 
guardar-te num gesto de poesia onde só se é livre. 

o amor não é a procura do sossego que nos castiga, 
é o litoral, do silêncio e do burburinho, dos afectos; 
o interior e a passagem íntima à flor da pele; o vento 
com todas as marés; um rio com todas as noites e dias. 

assim, abraço a tua ausência, que entra pela janela 
frágil e insone, fazemos amor com o ritmo da espera 
e fico como sal da tua pele num recanto do teu corpo. 

…descobrir a madrugada no teu olhar e a existência, 
sem conjecturas ou inquietações com a curvatura 
do espaço e do tempo, e inventar-nos lentamente. 


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sexta-feira, 6 de maio de 2016

das interioridades


rio zêzere | portugal


principias, para mim, inadiável, 
no exacto momento do inesperado, 
antes das minhas primeiras 
palavras. evidencias-te nelas 
e continuas, não sei até onde 
e quando, mas, muito para além 
do último verso, que é o lugar 
do sono e do sonho, depois de sair 
do corpo, em outra interioridade. 


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quinta-feira, 5 de maio de 2016

um aparte relacionado


aveiro | portugal


a sede ganha forma de raiz 
de planta sôfrega e inconsolável, 
onde se abriga a vontade. 

os átomos observam, 
com ternura, todo o enredo, 
resumido e aligeirado: 
castelos de vapor de água, 
poemas perfeitos, 
que os longos dedos 
do vento moldam, 
caem, no estado líquido, 
como lábios sobre a pele, 
terra sôfrega, cama desfeita. 

para alguns, são, apenas, nuvens 
cinzentas; chuva, chão e ervas, 
molhados. para outros é o amor; 
destes, uma parte, vê e sente 
que o amor está em todo o lado 
e crêem ser, o amor, o deus 
omnipresente. 

eu sou erva, água, terra, 
e sonhos clandestinos. 
e pouco sei destas coisas. 


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quarta-feira, 4 de maio de 2016

a noite soletrada


aveiro | portugal


porque há esperas feitas de azul, 
pinto a ria em fios de cores, 
que invento para distrair a noite. 
visto o ar que se vestiu de silêncio. 
a noite mais noite tatuou a noite 
que os dedos não alcançam. 
não se vêem as esculturas de água 
na parede do idioma lunar. 
posso enlouquecer definitivamente. 
finjo que escrevo poemas 
e a noite finge que os lê. 


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terça-feira, 3 de maio de 2016

naufrago em sol


aveiro | portugal


à porta dos meus lábios, 
naufrago em sol para subir a noite. 

hoje, não há espelho nas rugas da ria. 

os meus dedos silenciam-se, 
enquanto te leio os meus versos 
mil vezes, sem te encontrar, sem 
descobrir os erros do conteúdo, 
que conheço de cor, como se 
o seu lugar fosse um regresso 
e o teu lugar fosse em mim. 


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segunda-feira, 2 de maio de 2016

a insuficiência de ficar


aveiro | portugal


a insuficiência de ficar invisível ou eclipsado. 
essa procura de sossego que aparenta castigar 
e castiga. eu não sei se me prendi. bem sei 
que os dias se rasgam. mas, estou aqui, na lua, 
a trocar abismos entre um lugar de fome e outro 
de alheamento, onde a noite nos devolve e às 
sombras. é quando estas mais nos doem. 
mas é, também, através delas, que me agarro 
ao aforismo de sorrir. e sorrio, generosamente. 
o ruído do mundo passa por mim, atravessa 
o meu corpo. por vezes, falamo-nos. ele diz-me 
qualquer coisa e eu qualquer coisa lhe digo. 



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domingo, 1 de maio de 2016

“dia da mãe”


coimbra | portugal


o domingo entrou por mim dentro,
com o céu a escorregar-me no rosto.
o céu tem andado escorregadio,
eu tenho andado arredio, não tenho
notícias do mar e a ria foi uma sombra
parada, entre as minudências dos cais.

não precisei de dizer nada à minha mãe.
bastou um olhar, um abraço e dois beijos,
para a conversa ficar em dia. o resto:
foram boas palavras de enchimento
que os afectos dispensam
e a sociabilização aprecia.


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