quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Saudades de mim



Saudades de mim

Há quem coma,
porque nunca se sacia.

Eu não sou activo!
Eu não sou um herói!
Eu não sou atractivo!
Não sendo a lei,
sou quem nunca fui,
nem, de modo algum, serei.

Razões não tenho,
nem delas me quero encher.
Mostro sempre ao que venho
e o que posso perder.

O meu perder é igual ao teu,
em  feitio e forma,
e acontece-te como me ocorreu.
Como tu, sou um ser humano,
indivíduo sujeito ao engano.

Por mais que desesperes,
porque sempre mudas,
eu não sou quem tu queres,
nem nunca hei-de ser,
porque logo me estou a perder.

Perdido,
e mesmo assim,
estou esquecido,
errante deserto de jardim.

Eu não sou activo!
Eu não sou perfeito!
Mas, eu não sou passivo!
Não sendo lei,
fui para o esquecimento
e de lá não voltei.

Razões não posso dar,
se dizes que não as possuo.
Opinião sem arbitrar
é o pomo de discórdia que fruo.

O meu poder é igual ao teu!
Salobro, saloio, pequeno,
num préstimo que pouco deu.
Estranho e inútil atributo,
ele sim, irresoluto.

O pequeno mundo,
dos mal-entendidos,
daqueles que, num segundo,
me respeitam e transformam
e logo me subvertem e transtornam.

Com um pouco de nada
e outro de coisa nenhuma,
antífrase aprumada,
sou preenchido por uma lacuna.

Há quem não coma,
porque não tem mesmo o quê.

Estou cansado!
Estou dorido!
Estou saturado!
Quero deitar-me e dormir,
mas não um dormir de fingir.

Dormir e acordar sossegado,
sem sono,
sem vontade de ficar fatigado,
sem dono.

Quero ser eu,
apenas eu, em consciência,
aquele que se perdeu.
Quero repetir-me, longamente,
alongar-me imensamente.

Quero sorrir sem pagar por isso.
Quero ser eu,
cansado de ser omisso,
tenho saudades de mim.
Quero repetir-me sem fim!

Quero poder ser sincero,
e sê-lo discreto.
Gritar, falar e calar (espero),
sem recurso ou decreto.

Estou cansado!
Estou amargo!
Estou despojado!
Quero deitar-me e dormir,
mas não um dormir a fugir.

Dormir e acordar povo,
ser gente,
sem vontade de dormir de novo,
contente!

Quero ser eu,
não importa que seja breve;
não importa que seja ateu.
Deveria ser já,
a hora nem é boa, nem é má!

Quero, mais do que olhar,
ver como é,
e ser mimado como gosto de afagar.
Que importa se sou mansarda ou jasmim,
quero repetir-me sem fim!

Vontade,
quero dormir justo,
num verso junto à cidade,
no campo, a todo o custo.


6 comentários:

  1. Espectacular nem tenho mais palavras. Excelente! um grande beijinho. E dorme descansado... Sim! Porque mereces.

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  2. Verniz Negro:
    A este poema chamo-lhe: poesia menor! Dirá muito pouco a muitos mas, foi muito sentido, acredita.
    Obrigado!
    Beijinho

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  3. 2linhas:
    Sim, de certa forma poderia riscar todo o poema, ficava com o título num breviário e continuaria, ainda assim, a sentir as mesmas linhas.
    Sabes, tenho-me retraído, efectivamente, com as “linhas” . O termo acaba por se prestar a tanta dissertação e não queria beliscar, sequer, a 2linhas. Já tive alguns dissabores com o “ponto” e com o “laço”.
    Beijinho

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  4. Não sei o que responder, mas digo apenas que conheço bem as marcas desses beliscões, acredita.

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